terça-feira, 11 de novembro de 2014

Neste novembro de 2014, rememoro Alécio Cunha, que deixou o Planeta há cinco anos...

O Jornalista e Poeta Alécio Cunha, de Belo Horizonte, passa para outra dimensão

Postado por Clevane Pessoa em 30/11/2009 17:22:00
Alécio Cunha

"Como enigmática neblina. Quando o pó se esvai, sem chance à Fênix, resta apenas a imagem fugidia de tempo (e)terno." (Alécio Cunha)



Clevane Pessoa (*)



Parte o poeta certamente numa nuvem de estrelas.Ele, que teve a preocupação legítima de preocupar-se com a difusão de outras poetas, de artistas e literatos, sempre causou-me admiração –e o comentava com amigos.lembrava-me meus próprios tempos de jornalista, com página cultural, em Juiz de Fora.

Se entrevistava, ligava-se às respostas dadas, evitando o simples “pingue pongue “

Entre as perguntas e elas.Se assistia a uma representação artística-fosse teatral ou visual,

analisava enredos, protagonismo, personagens . Para escrever resenhas , lia de fato ,um livro.

Muitas vezes, por telefone, elogiei-lhe essa dedicação e senso de veracidade,ele parecia acanhado ao ouvir-me.E eu podia falar, pois não lhe pedira nada, nem mesmo fora por ele entrevistada.Era admiração pura e simples.

Ao receber meu exemplar de “Hoje em Dia”, abria primeiramente o Cadervo “Cultura’ e buscava seus escritos- o que nestes dias de sua internação, era representado pela ausência .

Certa feita, enfim , o conheci pessoalmente, dentro do Parque Municipal Américo Renê Gianetti, em Belo Horizonte, num Dia dos Pais coincidente com o Sementes de Poesia , espaço do Museu Nacional da Poesia-MUNAP- dirigido por Regina Mello, feliz e acompanhado pelo filho.Pessoa simples e agradável, comprometida com a cultura.

Espero que outros alécioscunha venham , tornado seu prenome e sobrenome um adjetivo sinônimo de excelência.

Com alegria, vi que tomara posse na ADL(Academia Dorense de Letras-de Boa Esperança), ele na qualidade de Membro Efetivo, filho as linda cidade à beira do lago ---eu já era Acadêmica Correspondente, proposta quando, após prêmios literários em concursos da mesma, fiz palestra sobre Carlos Drummond de Andrade e fui convidada pelo saudoso Dr. Naves .Mandei ao Aécio e-mail de congratulações a ele e à Academia.

Pouco antes do AVC, mandou-me e-mails pedindo que o lesse no blog aberto( * ).Fui e li, gostei, claro e deixei para escrever a respeito depois.Não deu tempo...
Dizem que as pessoas que morrem, viram santas e passam a ter todas as qualidades lembradas, esquecidos os defeitos.Não é este o caso Alécio Cunha era muito estimado pelo seu modus vivendus, pela sua maneira de ser, pelo seu jornalismo literário.Quando ele estava na UTI, recbi pedidos de prece, de mentalização positiva.Regina Mello, Diretora do MUNAP, uma das que solicitou isso.Eu obtinha notícias de Wilmar Silva, seu amigo.Havia um quê de comoção no ar quando os literatos e poetas, os jornalistas se encontravam e tocava-se no assunto da UTI, da longa espera de uma melhora.Mas onde apenas mortais limitados de percepção, não podemos ver à frente, o Alto vê.

E se é veraz o que o povo diz, que os verdadeiramente bons vão na frente, talvez seja uma boa explicação.



Leio a breve notícia:



“Morreu na noite desse sábado o jornalista mineiro Alécio Cunha. Ele era repórter e colunista do jornal Hoje em Dia, e estava internado desde 6 de outubro em função de um AVC, no Hospital Vila da Serra.

Alécio era casado com a jornalista Márcia Queiroz e tinha um filho de 8 anos. O velório acontece neste domingo, no Cemitério Parque da Colina. O enterro está marcado para as 16h.”



(http://www.uai.com.br/htmls/app/noticia173/2009/11/29/noticia_minas,i=137904/MORRE+O+JORNALISTA+MINEIRO+ALECIO+CUNHA.shtml)



Vejo, na foto, seu rosto cor da alma, as feições em reflexo desse espítito iantino .Parece-me uma daquelas pessoas que cumprem a afirmativa latina:”Ad maiora natus sum”(“Nasci para as Coisas do Alto”).



A esposa jornalista há de lembrar o companheiro, o pequeno filho, terá o exemplo do pai na palavra dos que o conheceram.



E nós que aqui ficamos, o aplaudimos e sabemos que ele voa livre e leve, agora.

Clevane Pessoa de Araújo Lopes



Diretora Regional do inBrasCi

Consultora de Cultura da Associação Mineira de Imprensa-AMI.
Cadeira 05 na AFEMIL(Poeta Cecília Meireles) e
Cadeira 11 na ADL/Mariana (Jornalsta Laís Corrêa de Araújo).
Belo Horizonte, Novembro, 2009







Alécio Cunha
Crônica da casa demolida



Tudo era trapo. Madeira corrompida, ventre de intrépidos cupins. O resto da casa, semi-dizimada, véspera da definitiva demolição, jazia sob sol de verão voraz.
Antes da chegada dos pedreiros e serventes que toparam o serviço, chegou à pretérita morada com uma fábrica de cliques a tiracolo, surrada e negra Kodacolor. A casa assassinada ainda não havia vindo a pique.
Passos lentos, caminha pelas paredes vazadas por martelos, amparadas por escoras, próximas a caçambas lotadas de pedregulhos e falecidos madeirames, descascados e podres.
As fotos são tímidas. Passeando pelos escombros, encontra a parte intacta da residência dos avós, onde a imagem quebradiça do Sagrado Coração de Jesus ocupa o alto parietal, próximo ao forro rasgado. Recolhe a peça, retira meticulosamente o vidro e guarda o tecido úmido, cheio de furinhos, óleo sobre tela, testemunha, ali do alto, de tantos encontros e desencontros, rancores e amores.
Resgata a pintura numa sacola e prossegue a caminhada. Curta, breve, átimo de segundo, comparado às quase nove décadas de vida da casa. Recorda o umbral da janela, as fortes tramelas de madeira, a chuva de antigos janeiros, fecunda em ventania e enxurrada, cachoeira aos olhos meninos.
Os barquinhos de papel-jornal, devidamente manipulados pelo avô, eram arremessados janela abaixo. É o primeiro contato com o universo da tragédia. Os naufrágios pioneiros integram batalhas navais imaginárias, estratégias militares que se repetem no amplo quintal, onde sabugos de milho, metamorfoseados em guerreiros, disputam o Santo Graal. O limoeiro é a Távola Redonda. Excalibur, a desejada espada, contenta-se com o formato de um canivete enferrujado.
O chiqueiro, lá atrás, escondido, na divisa entre o terreiro e o espaço vizinho, não guarda mais o ardido cheiro suíno, a lembrança travestida em trauma dos porcos castrados, berrando, sendo caçados sem dó nem piedade, antes de serem transformados em apetitosos torresmos. A dor dos leitões amarrados e trucidados era também o prazer comensal. Paradoxos desta doideira ao qual batizam vida. Do galinheiro, sobram pequenas minudências do gradil, envoltos em estrutura danificada.
Ele pega a câmera e, num último clique, registra a paisagem desolada. Na memória, secura do tempo presente, é cessado o espaço à epifania. Abandona a casa enquanto ouve os ruídos da chegada operária. Afasta-se, vagaroso, do ambiente. Na esquina da rua, encruzilhada à sombra da imponente Igreja Matriz, assiste, perplexo, ao crime. Menos de uma hora depois, espessa nuvem de poeira cobre o local. Como enigmática neblina. Quando o pó se esvai, sem chance à Fênix, resta apenas a imagem fugidia de tempo (e)terno." `



Postado em 29 de Setembro, 2009

(*)http://www.hojeemdia.com.br/cmlink/hoje-em-dia/colunas-artigos-e-blogs/semanais/alecio-cunha-1.350?month=8&year=2009

Fonte:http://www.eunanet.net/beth/news_coluna.php?col=75&pst=800

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